Problemas que afligem a nossa juventude

 CONVERSA, DEBATE e REFLEXÃO com o Pe. Félix Liberal da Diocese de Cabinda

Amados jovens delegados das distintas paróquias da nossa amada diocese. Principio esta exposição trazendo um sentimento de gratidão pela vossa disponibilidade e e presença nesta nossa jornada diocesana.

Recordar que o objectivo desta exposição não é tanto uma dissertação científica repleta de respostas para os subtemas elencados no nosso tema. Pelo contrário, um convite a um debate-reflexão à volta dos problemas que afligem a nossa juventude.

Trazemos como tema para esta nossa conversa, OS DESAFIOS DA EVANGELIZAÇÃO DA JUVENTUDE e como subtemas, a iniciação tradicional, casamento tradicional, a questão das heranças, o tratamento degradante dado a mulher e a mentalidade feiticísta.

A INICIAÇÃO TRADICIONAL

Na cultura tradicional binda, só pelos ritos de iniciação (pela circuncisão e pela casa de tintas) um rapaz ou uma rapariga entra na sociedade clânica e é considerada um membro adulto do grupo social. O homem já é homem pelos dizeres dos seus pais, mas os seus direitos só advêm por meio da circuncisão. Igual sorte, a mulher «chi-nkupa» (virgem) não é mulher para homem algum se na aldeia se não souber que ela já passou pela túkula ou nzo kualama. Por esta lei, segundo o direito costumeiro binda, nenhum homem pode tomar uma mulher por esposa sem que ela fosse declarada núbil pela cerimónia de kualama ou casa de tintas.

1- Quanto a circuncisão

A circuncisão é uma instituição tradicional pela qual o rapaz entra na sociedade clânica e se ratifica publicamente a sua virilidade. O não circuncidado era considerado ainda criança e a mulher não lhe concedia os seus favores nrm aceitava casar com ele. A idade para o efeito compreendia dos 8 a 14 anos de idade.

No interior da floresta capinava-se em círculo um certa extensão de terreno, que se via necessário segundo o número dos que iam ser circuncidados. Só eram permitidos assistir homens ou rapazes circuncidados. As mulheres não faziam parte do acampamento. «Acerimónis consiste fisiologicamente, na incisão prepúcio (lisutu) que era feito por um velho exercitado -nganga masutu».

Avaliação ética da circuncisão

A princípio, é importante dizer que a circuncisão é um valor, pois, durante o tempo da circuncisão os rapazes eram instruídos na história, nas tradições, usos e costumes; no conhecimento de provérbios e toda vasta cultura oral; nos feitiços e práticas religiosas, nas obrigações que assumirão brevemente perante a família. Receberão instruções concretas e pormenorizadas sobre os actos sexuais e os problemas referentes ao casamento. Portanto, ela significava a morte da antiga vida juvenil e o nascimento, a entrada na vida adulta e gregária da etnia com novas forças, novos privilégios, novas obrigações.

Terminado este momento, cada um era confiado a um velho responsável e seguro para que não haja abusos sexuais; não intervenha o feiticeiro, nem a ideia feiticísta esteja ligada; 

2- Quanto a casa de tintas

O nome casa da tinta é uma designação muito genérica, pode ser usado para designar nzo kumbi, casa para onde a rapariga ia depois da primeira manifestação da puberdade; designa também nzo kuálama, a casa onde a rapariga entra para as cerimonias que precedem a tomada de estado ou aos casamentos. Ela é designação dada pelos europeus, pois as raparigas que passam por estas cerimónias são pintadas todos dias com túkula, durante o tempo que lá estiverem. O nome das tintas provém por analogia do termo túkula que quer dizer cor avermelhada.

Avaliação ética da casa de tintas

Passar pela casa de tintas significa passar pelas cerimónias da puberdade ou das que antecedem as do casamento. Kualika representa a passagem à idade adulta, por elas se dá a conhecer oficial e publicamente, que chegou a idade da puberdade. Por isso, a este cerimónia nenhuma rapariga faltará, pois, seria ao essencial que a faria uma mulher. Porque segundo o costume, tal como disse a pouco sobre o rapaz, a mulher chinkupa (virgem) não é mulher para homem algum se na aldeia se não souber que ela já passou pela túkula. Por este lei é proibido qualquer homem fazer uso da chinkupa ainda não iniciada. Quem fizer isto mancha a terra e comete crime contra a terra de Mangoyo.

Durante o tempo, um, dois ou três meses que permanecer dentro da casa de tintas recebe algumas instruções. A doutrinação é dada por uma velha mestra. Dela aprenderá tudo que precisa saber sobre a vida que a espera. Receberá doutrinação pormenorizada e concreta sobre os modos de coabitar, de proceder com o marido para o tornar feliz. Receberá elucidação sobre os seus deveres de esposa, mãe, dona de casa. Pantentear-se os segredos da vida familiar na qual vai tomar parte oficialmente, respeitante aos usos, costumes, vida social e religiosa.

Depois de tudo que já se esmiuçou, ratificamos que a nossa iniciação tradicional é uma instrução, uma escola de valores, uma componente educativa; uma escola do noivado. Todavia, hoje vemos algumas sombras à volta dela: a perda da sua essência (deixou de ser espaço da instrução e de ratificação da maturidade onde os jovens saiam homem e mulher) ; a morte da componente educativa que é substituída pela televisão e pelas ruas. E, por isso, vemos moças já a coabitarem com os maridos que não são ainda mulheres… perdeu-se o valor e respeito pela virgindade, pois, até casar-se a menina se calhar já este esteve com cinco, dez ou mais rapazes.

Pois bem, meus caros jovens, é quase um imperativo falar-vos da necessidade de um renascimento cultural de Cabinda ou dos valores da cabindanidade.

CASAMENTO TRADICIONAL, O ALAMBAMENTO.

O casamento na cultura tradicional ibinda binda é uma instituição sócio-religiosa pela qual o homem se une a uma mulher… exige muito tempo, por isso se realiza em e por etapas. Segundo as prescrições do Ngoyo, o homem que pretende uma mulher começa por falar seus pais por meio de um enviado. O casamento exige um conjunto de assentimentos que decidem a justeza a fim de tornar sólida a aliança. O certo é que, pelo casamento um jovem casal adquire a plena participação na vida social. A participação +e um dever preciso e direito de todos. Mas este direito «de casar» só é possível segunda a cultura tradicional binda caso se tenha passado pelos ritos de iniciação.

O alambamento, um obstáculo na vida dos jovens.

O alambamento é um instrumento jurídico costumeiro que confere validade e dignidade ao casamento na cultura tradicional binda. Este instrumento está radicado na mentalidade do povo e faz parte daquele tecido mais precioso de suas tradições sagradas que passam de geração em geração. Eliminá-lo pura e simplesmente seria uma autêntica traição. Segundo a tradição, através dele se estabelece alianças interfamiliares, se melhoram e se dignificam as relaçoes conjugais e sociais. É fundamento de fidelidade da mulher para com o marido. Ele confere um carácter legal e uma relativa estabilidade ao casamento. Na sua pureza e originalidade consiste na troca de presentes entre famílias.

Hoje, porem, constata-se uma apetência exagerada sobre o seu valor. Há um desvia do verdadeiro sentido cultural do alambamento. Um novo sentido foi produzido e encontra o seu fundamento material numa ordem económica. A procura destes bens materiais é experimentada e vivida no seio das famílias muito ou pouco no esquecimento do verdadeiro sentido em que se reveste o acto. De acordo a circunstância concreta em que se processa, hoje, este instrumento reveste-se de abusos, pois a sociedade confere-lhe um pendor comercial. Hoje, as filhas tornaram-se fontes de rendimento para as famílias. Quase em todo lado já se afirma, alto e bom som - embora as vezes exageradamente - que o casamento está muito caro, o homem compra a noiva e o alambamento é um dos elementos dessa autentica transacção.

Por isso, a legislações civis e eclesiásticas devem, ajudar as autoridades tradicionais afim de o alambamento evoluir e voltar a sua pureza de essência de acordo a prática e exigências tradicionais. Mas isto, não será possível não houver cooperação entre instituições competentes.

A mulher no contexto cultural judaico

Segundo o talmude, na pessoa do rabi Levy, Deus considerou a partir de qual parte do homem iria criar a mulher e disse: não vou criá-la a partir dos olhos para que não se torne coquete; nem da orelha, para que não escute atrás das portas; nem da boca, para que não se ponha a tagarelar; nem do coração, para que não seja ciumenta; nem da mão, para que não vá mexer em tudo; nem do pé, para que não fique sempre saindo de sua casa; irei criá-la da parte mais discreta do homem por mesmo quando ele está nu essa parte continua escondida.

Este é um testo importante para compreender com mais justeza a situação da mulher no pensamento rabínico. Nele se encontram pontos que consideramos muito negativos, todas as reprovações que o talmude faz pesar sobre a mulher: frívola, de inteligência limitada, coquete a ponto de só de preocupar com a aparência, curiosa e tagarela… excluída da vida pública, só deve sair de casa coberta com um véu, que não pode falar com um homem na rua, nem mesmo em casa; para a mulher há um limite que não deve ser ultrapassado. 

No evangelho de são João 4,7 começa o diálogo de Jesus com a samaritana e, vemos que ao chegarem os discípulos, isto é, no versículo 27 do mesmo capítulo, ficam estupefactos, pois era proibido falar com uma mulher, assim como era proibido fazer-se servir por uma mulher que não era sua.

À sua mãe Jesus dissera: mulher, que queres de mim? Jo 2,4 (mulher, que há entre mim e ti? Entre o homem e a mulher o que há é a serpente, o mal; e o talmude, como toda a tradição bíblica, está fortemente marcado esta essa dolorosa realidade.

O texto da mulher adúltera é mais um espelho do machismo do mundo judaico (Jo 8, 1-11). Falei a pouco da proibição de falar com a mulher e de servir-se de uma que não fosse sua. Agora onde está neste testo o homem que adulterou com ela? Nem se fala dele… é como se o subir sobre a mulher do outro não um fosse um crime entre os judeus…

No milagre da multiplicação dos pães e peixes de Mateus 14, 13-21, o relato termina dizendo que «os que comeram eram cerca de cinco mil homens, mulheres e crianças. Portanto, a mulher não era tida como tal, pois, a sua inferioridade diante do homem era demasiado grande

No anuncio da noticia da ressurreição (Mc 16, 1-8) aparece a mulher como a primeira portadora desta notícia, mas Pedro e o discípulo mais amado não correm do nada às pressas para o sepulcro. Isto acontece porque a mulher na cultura judaica era tida de mentirosa por natureza e, por isso, não poderias testemunha nada, era semelhante a criança que ainda não tinha atingido os seus 12 anos, portanto, era um sujeito jurídico, não tinha direitos.

Ao envolver a figura da mulher como decisiva na história da salvação, Jesus irá inaugurar uma nova era da história na qual o mistério da mulher será revelado; a mulher é emancipada, uma emancipação que será uma verdadeira assunção, culminando no céu, com a coroação da virgem por seu seu filho.

A mulher no nosso contexto cultural

Tal como o mundo judaico, somos machistas. Esses machismos como no seio da família em que vemos os trabalhos de casa todos sendo feitos pela mulher enquanto os rapazitos esticam-se esperando a hora da mesa. 

No Mayombe, é comum ver a esposa vinda da lavra toda ela carregada com cesto todo abarrotado, com a criança enquanto o senhor marido anda somente com uma catana na mão… chegam juntos da lavra e ainda pergunta nervoso à mulher: que hora vai comer hoje? Já nas cidades, o jovem que ajuda sua mulher é considerado bouelo. 

Pe. Félix Liberal 

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